quarta-feira, 9 de novembro de 2016

Por que Hillary Clinton, “A rainha do caos”, é bem pior que Trump?

Por que Hillary Clinton é bem pior que Trump?

Publicado no site Desacato em 29/07/2016
Charge Latuff para  a MONDOWEISS

Entrevista de Ángel Ferrero com Diana Johnstone.

Tradução: Elissandro dos Santos Santana.



N. da R.: A entrevista é de maio, mas ela continua atual.
Diana Johnstone é, talvez, uma das comentaristas da política europeia e estadunidense mais reputada na esquerda.  Colaboradora, entre outros, Counterpunch, Johnstone, tornou-se conhecida na Europa por suas críticas à política ocidental durante as guerras nos Balcãs, acaba de publicar um livro sobre Hillary Clinton que tem como título “A rainha do caos”. A entrevistou para lamarea.com Ángel Ferrero.
Os meios estadunidenses têm colocado sua atenção nestas primárias em Donald Trump. Porém, em sua opinião, Hillary Clinton também deveria ser motivo de preocupação. Tem-na descrito como “a rainha do caos”. Por quê?
Trump consegue manchete por que é uma novidade, um homem midiático que diz coisas polêmicas. É visto como um intruso em um espetáculo eleitoral desenhado para transformar Clinton na “primeira mulher presidenta dos Estados Unidos”. Por que a chamo de rainha do caos? Em primeiro lugar, por causa da Líbia. Hillary foi, em grande medida, responsável pela guerra que afundou a Líbia no caos, um caos que se estende até o resto da África e, inclusive, da Europa. Tem defendido mais guerra ao Oriente Médio.
Minha opinião não é que Hillary Clinton “também deveria” ser motivo de preocupação. Ela é o principal motivo para preocupação. Clinton promete apoiar mais a Israel contra os palestinos. Está totalmente comprometida com a aliança de fato entre Arábia Saudita e Israel que tem como objetivo derrocar Assad, fragmentar Síria e destruir a aliança xiita entre Irã, Assad e o Hezbollah. Isto aumenta o risco de confronto militar com Rússia e Oriente Médio. Ao mesmo tempo, Hillary Clinton defende uma política beligerante contra Rússia na fronteira com a Ucrânia. Os meios de comunicação de massas no Ocidente se negam a dar conta que muitos observadores sérios, como, por exemplo, John Pilger e Ralph Nader, temem que Hillary Clinton nos conduza, sem adverti-lo, à Terceira Guerra Mundial.
Trump não se ajusta a este modelo. Com seus comentários grosseiros, Trump se desvia, radicalmente, do padrão dos lugares comuns que ouvimos dos políticos estadunidenses. Porém, os meios de comunicação estabelecidos têm sido lentos em reconhecer que o povo estadunidense está completamente cansado de políticos que se ajustam ao padrão. Esse padrão está personificado por Hillary Clinton. Os meios de comunicação europeus têm apresentado Hillary Clinton como a alternativa sensata e moderada ao bárbaro de Trump. No entanto, Trump, o “bárbaro”, está a favor de reconstruir a infraestrutura do país em vez de gastar o dinheiro em guerras no estrangeiro. É um empresário, não um idealista.
Trump afirmou, claramente, sua intenção de pôr fim à perigosa demonização de Putin para desenvolver relações comerciais com Rússia, o que seria positivo para os Estados Unidos, para a Europa e para a paz mundial. Estranhamente, antes de decidir apresentar-se como republicano, para consternação dos líderes do Partido Republicano, Trump era conhecido como democrata e era a favor de políticas sociais relativamente progressistas, a esquerda dos atuais republicanos ou, inclusive, Hillary Clinton.
Trump é imprescindível. Seu recente discurso no AIPAC, o principal lobby pró-israelense, foi excessivamente hostil com o Irã, e em 2011 caiu na propaganda que conduziu à guerra contra a Líbia, inclusive, sim, agora, retrospectivamente, à crítica. É um lobo solitário e ninguém sabe quem são seus assessores políticos, porém, há esperança de que lance fora da política aos neoconservadores e intervencionistas liberais que têm dominado a política exterior estadunidense nos últimos quinze anos.
Os assessores de Clinton destacam sua experiência, em particular, como secretária de Estado. Muito se tem escrito acerca desta experiência e nem sempre de maneira positiva. Qual foi seu papel na Líbia, Síria e Honduras?
Há duas coisas para dizer sobre a famosa experiência de Hillary Clinton. A primeira é observar que sua experiência não é o motivo de sua candidatura, mas, sim, a candidatura é o motivo de sua experiência. Em outras palavras, Hillary não é candidata devido a que sua experiência maravilhosa tenha inspirado ao povo escolhê-la como aspirante à presidência. É mais correto dizer que acumulou esse currículo justamente para qualificar-se como presidente.
Durante aproximadamente 20 anos, a máquina clintonita que domina o Partido Democrata planejou para que Hillary se transformasse na “Primeira mulher presidenta dos Estados Unidos” e sua carreira foi desenhada com esse propósito: em primeiro lugar, senadora de Nova Iorque, depois, secretária de Estado.
O segundo diz respeito ao conteúdo e à qualidade dessa famosa experiência. Tem se obstinado em demonstrar que é forte, que tem potencial para ser presidenta. No Senado votou a favor da guerra do Iraque. Desenvolveu uma relação muito próxima com o intervencionista mais radical de seus colegas, o senador republicano pelo Arizona, John McCain. Uniu-se aos chauvinistas religiosos republicanos para apoiar medidas para fazer com que queimar a bandeira estadunidense fosse um crime federal. Como secretária de Estado trabalhou com “neoconservadores” e, essencialmente, adotou uma política neoconservadora utilizando o poder dos Estados Unidos para redesenhar o mundo.
No que diz respeito a Honduras, sua primeira importante tarefa como secretária de Estado foi proporcionar cobertura diplomática para o golpe militar de direitas que derrubou o presidente Manuel Zelaya. Desde então, Honduras se transformou na capital com mais assassinatos do mundo. Com relação à Líbia, persuadiu ao presidente Obama para derrubar o regime de Gaddafi utilizando a doutrina de “responsabilidade para proteger” (R2P) como pretexto, baseando-se em falsas informações. Bloqueou ativamente os esforços de governos latino-americanos e africanos para mediar, e, inclusive previu os esforços da inteligência militar estadunidense para negociar um compromisso que possibilitasse a Gaddafi ceder o poder pacificamente.
Continuou essa mesma linha agressiva com a Síria, pressionando ao presidente Obama para que incrementasse o apoio aos rebeldes anti-Assad e inclusive para impor uma “zona de exclusão aérea” baseada no modelo líbio, arriscando-se a uma guerra com a Rússia.  Caso se examine com atenção, sua “experiência” mais que qualifica-la ao posto de presidenta, desqualifica-a.
Como secretária de Estado, Clinton anunciou em 2012 uma “articulação” à Ásia oriental na política exterior estadunidense. Que tipo de política nós poderíamos esperar de Clinton em relação à China?
Basicamente, esta “articulação” significa um deslocamento do poder militar estadunidense, em particular, naval, desde Europa e Oriente Médio ao pacífico Ocidental. Supostamente, porque devido ao seu crescente poder econômico, a China há de ser uma “ameaça” potencial em termos militares. A “articulação” implica a criação de alianças antichinesas entre outros Estados da região, o que com toda probabilidade incrementará as tensões, e cercando a China com uma política militar agressiva a empurra efetivamente para uma corrida armamentista. Hillary Clinton aposta em sua política e se chegasse à presidência, a intensificaria.
Clinton disse em 2008 que Vladimir Putin não “tem alma”. Robert Kagan e outros “intervencionistas liberais” que desempenharam um papel destacado na crise da Ucrânia a apoiam. Sua política em direção a Rússia seria de um maior enfrentamento que a dos outros candidatos?
Sua política seria claramente de um maior confronto em relação à Rússia que as de Donald Trump. O oponente republicano de Trump, Ted Cruz, é um fanático evangélico de extrema direita que seria tão prejudicial como Clinton, ou, talvez, pior. Compartilha da mesma ideia semirreligiosa de Clinton no papel “excepcional” dos Estados Unidos para modelar o mundo à sua imagem. Por outra parte, Bernie Sanders se opôs à guerra do Iraque. Não tem falado muito de política internacional, porém seu caráter razoável sugere que seria mais sensato que qualquer dos demais.
Os assessores de Clinton tratam de destacar seu intento de reformar o sistema sanitário estadunidense. Foi essa a intenção de reforma realmente um avanço e tão importante como dizem que foi?
Em janeiro de 1993, poucos dias depois de assumir a presidência, Bill Clinton mostrou sua intenção de promover a carreira política de sua esposa nomeando-a presidenta de uma comissão especial para a reforma do sistema nacional de saúde. O objetivo era levar a cabo um plano de cobertura sanitária, baseado no que se denominou de “competitividade gestora” entre empresas privadas. O diretor dessa comissão, Ira Magaziner, um assessor muito próximo de Clinton, foi quem desenhou o plano. O papel de Hillary era vender politicamente o plano, especialmente ao Congresso. E nisso fracassou por inteiro. O “plano Clinton” de umas 1.342 páginas foi considerado demasiado complicado de entender e a mediado de 1994 perdeu praticamente todo o apoio político. Finalmente, encerrou-se no Congresso.
Respondendo à pregunta, o plano basicamente não era seu, mas de Ira Magaziner. Como havia de depender das seguradoras particulares voltadas para o benefício, como ocorre com o Obama Care, certamente não era um avanço, como é o sistema universal que Bernie Sanders defende.
A campanha de Clinton recebeu notoriamente dinheiro de vários fundos de rede. Como acredita que poderia determinar sua política econômica se consegue chegar à Presidência?
Quando os Clinton abandonaram a Casa Branca, em janeiro de 2001, Hillary Clinton lamentou estar “não somente quebrado, mas em dívida”. Isso mudou logo. Falando figuradamente, os Clinton se mudaram da Casa Branca a Wall Street, da presidência ao mundo das finanças. Os banqueiros de Wall Street compraram uma segunda mansão para os Clinton no Estado de Nova Iorque (que se somou à que têm em Washington DC) emprestando-lhes primeiro o dinheiro e, depois, pagando-lhes milhões de dólares para dar palestras.
Suas amizades no setor bancário lhes permitiram criar uma fundação familiar agora valorada em dois bilhões de dólares. Os fundos da campanha procedem de fundos de investimento amigos que colaboraram de bom agrado. Sua filha, Chelsea, trabalhou para um fundo de investimento antes de se casar com Marc Mezvinsky, quem criou seu próprio fundo de investimento depois de trabalhar para Goldman Sachs.
Em poucas palavras, os Clinton se submergiram por completo no mundo das finanças, que se converteu em parte de sua família. É difícil imaginar que Hillary se mostrasse tão ingrata como para levar a cabo políticas contrárias aos interesses de sua família adotiva.
Diz-se que a política de identidade é outro dos pilares de sua campanha. Quem apoia  Clinton afirma que votando nela se quebrará o teto de vidro e que, pela primeira vez na história, uma mulher entrará na Casa Branca. A partir de vários meios, tens protestado contra esta interpretação.
Uma razão fundamental para que se desse a aliança de Wall Street com os Clinton é que os autoproclamados “novos democratas” encabeçados por Bill Clinton conseguiram mudar a ideologia do Partido democrata da identidade social à igualdade de oportunidades. Em vez de lutar pelas políticas tradicionais do novo acordo que tinham como objetivo incrementar os estandartes de vida da maioria, os Clinton lutam pelos direitos das mulheres e das minorias a “ter sucesso” individualmente, a “quebrar tetos de vidro”, avançar em suas carreiras e enriquecer-se. Esta “política de identidade” quebrou a solidariedade da classe trabalhadora, fazendo com que as pessoas se centrassem na identidade étnica, racial ou sexual. É uma forma de política do “divida e vencerás”.
Hillary busca persuadir as mulheres mostrando-lhes que sua ambição é a de todas elas e que votando nela, estão votando por elas mesmas e pelo sucesso futuro. Este argumento parece funcionar melhor entre as mulheres de sua geração que se identificaram com Hillary e simpatizaram com o apoio leal a seu marido, apesar de seus flertes. Porém, a maioria das jovens estadunidenses não se deixa levar por este argumento e busca motivos mais sólidos na hora de votar. As mulheres deveriam trabalhar juntas pelas causas das mulheres, como, por exemplo, pelo mesmo salário e pelo mesmo trabalho, ou a disponibilidade de orfanatos para as mulheres trabalhadoras. Mas Hillary é uma pessoa, não uma causa, Não há nenhuma prova de que as mulheres, em geral, tenham se beneficiado no passado por terem uma rainha ou uma presidenta. E mais, ainda que a eleição de Barack Obama tenha deixado os afro-americanos felizes por motivos simbólicos, a situação da população afro-americana tem piorado.
Mulheres jovens, como Tulsi Gabbard ou Rosario Dawson, consideram que colocar fim a um regime de guerras e mudanças de regime e proporcionar a todo o mundo uma boa educação e saúde são critérios muito mais significativos na hora de escolher um candidato.
Por que as minorias seguem apoiando Clinton em vez de apoiar a Sanders?
Está mudando. Hillary Clinton ganhou o voto negro nas primárias nos Estados do sul profundo. Foi no começo da campanha, antes que Bernie fosse conhecido. No sul profundo, muitos afro-americanos estavam desencantados porque muitos deles estavam na prisão ou haviam estado na prisão, e a maioria de votantes é de mulheres mais velhas que vão regularmente à igreja, onde escuta os pregadores pró-Clinton, não o que se diz na internet.
No norte as coisas são diferentes, e a mensagem de Sanders está conseguindo estender-se. O apoia a maior parte de intelectuais afro-americanos e de afro-americanos do mundo do entretenimento. Esta é a primeira eleição presidencial onde a internet desempenha papel chave. Especialmente a população jovem que não confia nos meios de comunicação estabelecidos. É suficiente ler os comentários dos leitores estadunidenses na internet para dar-se conta de que Hillary Clinton é considerada amplamente como uma mentirosa, uma hipócrita, uma belicista e um instrumento de Wall Street.
Como vês a campanha de Bernie Sanders? É vista como a esperança da esquerda, porém, após a presidência de Obama também há certo ceticismo. Alguns comentaristas sinalizaram seu apoio a intervenções militares estadunidenses no passado.
À diferença de Obama, quem prometeu uma “mudança” vaga, Bernie Sanders é bem concreto na hora de falar das mudanças que se tem que fazer na política doméstica. E insiste em que ele sozinho não pode fazê-lo. Sua insistência no fato de que se precisa de uma revolução política para conseguir suas metas está realmente inspirando o movimento de massas que necessitaria. É suficientemente experiente e teimoso para evitar que o partido o rapte como ocorreu com Obama.
Enquanto à política exterior, Sanders se opôs firmemente e, de maneira racional, à guerra de 2003 no Iraque, porém como a maior parte da esquerda se deixou levar pelos argumentos a favor das “guerras humanitárias”, como a desastrosa destruição da Líbia.
Mas, este tipo de desastre tem começado a educar as pessoas e, talvez, tenha servido de lição para o próprio Sanders. As pessoas podem aprender. Podem ouvir entre os que lhe apoiam, a antibelicistas como a congressista Tulsi Gabbard do Havaí, que apresentou sua demissão no Comitê Nacional Democrata para apoiar Sanders. Há uma contradição óbvia entre o gasto militar e o programa de Sanders para reconstruir EEUU. Sanders oferece uma maior esperança porque vem com um movimento novo, jovem e entusiasta, enquanto Hillary vem com o complexo militar-industrial e Trump vem com ele mesmo.
Atualmente vive na França. Como vê a situação no país? Que explica a subida da Frente Nacional, paralelamente a outras forças da nova direita (ou nacional-conservadoras)?
Os partidos estabelecidos seguem as mesmas políticas impopulares na Europa e nos EUA e isso, naturalmente, leva o povo a buscar algo diferente. O controle local dos serviços sociais se sacrifica a necessidade de “atrair investidores”, em outras palavras, a dar ao capital financeiro a liberdade de modelar sociedades, dependendo de suas opções de investimento. A desculpa é que atraindo investidores se criarão empregos, porém isso não ocorre. Posto que a chave destas políticas é romper com as barreiras nacionais para permitir ao capital financeiro ganhar acesso, é normal que o povo vá aos chamados partidos “nacionalistas” que asseguram querer restaurar a soberania nacional. Como na Europa sobrevivem os fantasmas do nazismo, “soberania nacional” se confunde com “nacionalismo”, e “nacionalismo” se equipara com guerra. Estas suposições fazem com que o debate na esquerda seja impossível e termine favorecendo aos partidos de direita, que não sofrem deste ódio ao Estado nacional.
Em vez de atuar com horror à direita, a esquerda necessita ver as questões que afetam realmente o povo, com clareza.
No passado, tem criticado à esquerda (ou a uma parte considerável dela) por apoiar as chamadas “intervenções humanitárias”. Que opina da “nova esquerda” ou “nova nova esquerda” em países como Grécia e Espanha?
A propaganda neoliberal dominante justifica a intervenção militar por motivos humanitários, para “proteger” o povo de “ditadores”. Esta propaganda teve muito êxito, especialmente, na esquerda, onde, com frequência, se aceita como uma versão contemporânea do “internacionalismo” da velha esquerda, quando na realidade é todo o oposto: não se trata das brigas internacionais e seu idealismo combatendo por uma causa progressista, mas do Exército estadunidense bombardeando países em nome de alguma minoria que pode acabar revelando-se como um grupo mafioso, ou terroristas islâmicos.
Honestamente, acredito que este livro é um aporte à crítica da política intervencionista liberal, e lamento que não esteja disponível em espanhol, ainda que existam edições em inglês, francês, italiano, português, alemão e sueco.
Fonte: Katehon.

domingo, 6 de novembro de 2016

"Recomeçar do zero", esquecendo Lula, é a profilaxia recomendada pelos sábios do golpe em todas as frentes.

Por que eles querem que o Brasil esqueça Lula?

Por que com ele é como se Getúlio falasse; ou Allende para os chilenos; ou Perón para os argentinos; ou Cárdenas para os mexicanos. Com uma diferença: Lula vive

Por: Saul Leblon - Carta Maior - 04/11/2016

Respira-se um cheiro azedo de fardas, togas e ternos empapados da sofreguidão nervosa que marca as escaladas de demolição do Estado de Direito nos solavancos da História.

Consulte os anos 30 na Alemanha, os 50 do macarthismo norte-americano, os 60 da ditadura brasileira, os 70 do massacre chileno...

Há um clima de dane-se o pudor por parte das elites e da escória que a serve.

Faz parte desses crepúsculos institucionais a perda dos bons modos e a convocação das milícias, enquanto o jornalismo isento finge não ver a curva ascendente do arbítrio.

Com a mesma desenvoltura com que se anistia montanhas de dólares remetidos ao exterior, classifica-se o MST como ‘movimento criminoso’.

Persegue-se e intimida-se estudantes secundaristas com lista de nomes exigindo que se delate endereços de colegas ocupantes ...

Invade-se a bala dependências e movimentos sociais e de metralhadora em punho escolas tomadas por adolescentes que reclamam o direito de opinar sobre a própria educação.

Ensaios da orquestra.

Decibéis crescentes, afiados pelo mesmo diapasão ecoam de diferentes pontos do país.

Só não ouve quem não quer.

Há dinheiro, patrocínio e poder em jogo na incapacidade auditiva para ouvir os gritos da democracia sendo violada na sala ao lado de onde se discute a ‘reconstrução do Brasil’.

A conveniência reflete a insurgência que se esboça.

A resistência ao golpe escapa ao que se supunha ser o alvo isolado e triturado pela centrífuga da Lava Jato.

Adolescentes falam o que a vastidão dos votos nulos, brancos e abstenções cifraram nas urnas municipais, quando suplantaram os vitoriosos de São Paulo, Rio, Belo Horizonte e Porto Alegre...

Se as duas vozes se fundirem num idioma único, o que acontecerá?

O cheiro azedo exalado das fardas, togas e ternos de corte fino, empapados da sofreguidão nervosa, reflete essa esquina incerta da História para a qual caminha o país.

A truculência policial e midiática sobe rápido os degraus da exceção.

Essa é a hora diante da qual a resistência progressista não pode piscar.

Daí a importância da campanha lançada neste dia 10 de novembro para sacudir a hesitação em defesa do óbvio.

O óbvio hoje começa por defender Lula.

Porque sem defender Lula, não será possível defender mais ninguém, e mais nada, do galope desembestado da ganância no lombo da violência fardada e da cumplicidade togada.

Por ninguém, entenda-se o Brasil assalariado e o dos mais humildes.

A imensa maioria da população.

Aquela que vive do trabalho, depende de serviços públicos, tem seu destino atado ao do país, ao do pre-sal, ao da reindustrialização, ao da democracia social, carece de cidadania, respira salário mínimo e enxerga na previdência o único amparo à velhice e ao infortúnio.

Lula é a espinha histórica das costelas de resistência que precisam se unir para conter a demolição em marcha disso tudo.

Desempenha essa função por uma razão muito forte.

Essa que o milenarismo gauche parece ter esquecido --ou hesita em saber que sabe-- enquanto aguarda o juízo final de Moro para recomeçar do zero.

‘Recomeçar do zero’ é a profilaxia recomendada pelos sábios do golpe em todas as frentes.

Desde a demolição dos direitos trabalhistas, à revogação da soberania no pre-sal, passando pela Constituição de 1988, o Prouni, a previdência ...

Mas, principalmente: recomeçar do zero esquecendo Lula.

Porque ele é –ainda é Lula-- a inestimável referência de justiça social na qual a imensa parcela dos brasileiros de hoje e de ontem se reconhecem.

É dele a voz que quando fala e é ouvida no campo e nas cidades.

Mais que simplesmente ouvida: respeitada e compreendida.

A diferença dessa voz é que ela não carrega só palavras.

Carrega experiência, luta, erros, acertos, raiva, riso, derrotas, vitórias, cujo saldo são conquistas coletivas encarnadas em holerite, comida, emprego, autoestima e esperança.

sábado, 5 de novembro de 2016

PEC 241 (55) no setor de saúde. Como congelar gastos com saúde por 20 anos se nesse período os idosos irão dobrar?

PEC 241 parte do princípio de que se a economia não permitir, a população não irá adoecer… nem envelhecer

Por Hildegard Angel -  01/11/2016

Via de regra, escritórios de assessoria de comunicação me enviam, a título de colaboração, artigos e comentários de profissionais abrangendo temas diversos. Não me lembro de ter me detido em algum, particularmente. Mas este artigo do especialista na área de saúde David Stacciarini, sócio e diretor jurídico do aplicativo Docway, impressionou-e muito bem e eu gostaria de compartilhar com vocês. Vem a calhar e merece ser lido. Vamos a ele:
CHARGE BRUNO GALVÃO

A PEC 241 E O FUTURO DA SAÚDE NO BRASIL

David Stacciarini
“Uma vez aprovada a nova regra, caberá à sociedade, por meio de seus representantes no parlamento, alocar os recursos entre os diversos programas públicos, respeitando o teto de gastos. Vale lembrar que o descontrole fiscal a que chegamos não é problema de um único Poder, ministério ou partido político. É um problema do país! E todo o país terá que colaborar para solucioná-lo.” Assim termina a proposta da PEC 241 feita pelo ministro da Fazenda, Henrique de Campos Meirelles, e pelo ministro do Planejamento, Dyogo Henrique Oliveira.

O Conselho Deliberativo da Fiocruz, a Fundação Oswaldo Cruz, instituição estratégica do Estado para a ciência e a tecnologia em saúde, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a Rede Brasileira de Escolas de Saúde Pública (RedEscola), as secretarias de Saúde de inúmeros municípios e estados, professores de Medicina de inúmeras universidades respeitadas no Brasil, bem como o próprio ex-ministro da saúde, José Gomes Temporão, vetam a aprovação da PEC 241/16. Mas por qual motivo?

A Proposta de Emenda à Constituição 241/16 não tem como objetivo salvar a economia? Ocorre que austeridade na saúde não é novidade, tal medida já ocorreu em outros países, e inclusive foi alvo de inúmeros estudos internacionais, um deles famoso trabalho realizado pelo pesquisador David Stucler, de Oxford, conhecido como Multiplicador Fiscal. Mas, o Governo Federal Brasileiro, realiza uma reflexão importante, e todos podemos concordar que isso é o ideal em uma nação, ao propor que seus gastos não sejam maiores do que recolhe em tributos e impostos. Porém, o mesmo raciocínio não se aplica ao setor de saúde, área em que há algo inevitável, imutável e que não pode ser controlado: o envelhecimento da população. Tal elemento não está sendo colocado na equação da PEC 241.

Pois as doenças não aparecem em uma economia favorável ou desfavorável, elas não são concursos públicos, criados de acordo com a necessidade do estado. Independendo dos fatores econômicos ou políticos, as doenças aparecem sempre, não importa o tamanho de sua economia ou de sua nação. O que muitos estudos vêm apontando, inclusive para maior desgosto do estado, é que é nos países em recessão econômica que mais se manifestam as doenças e os surtos mais ocorrem.

O Brasil possui um sistema de saúde universal replicado do modelo britânico (NHS- National Health Service). Apesar de oferecermos um sistema semelhante de saúde, é muito difícil para o Brasil acompanhar o modelo clonado, uma vez que nosso orçamento é cinco vezes menor do que o da Inglaterra. Infelizmente, diferente de outras áreas, não é possível estabilizar um valor para a saúde, justamente devido à população estar sempre adoecendo. Viver e morrer é destino da vida de todo homem. Todos os países do mundo vêm aumentando, com o decorrer dos anos, o percentual do seu orçamento no setor de saúde.

Como já esclarecemos, a população envelhece e novas doenças aparecem. Um estudo levantado afirma que, em 20 anos, a população idosa irá dobrar. Isso implica em doenças crônicas, degenerativas, do coração, em vários tipos de câncer. E essa é a preocupação de todos esses especialistas em saúde acima citados. A PEC 241 funcionaria muito bem em outros setores, mas é uma arma perigosa que coloca em risco o setor de saúde.

Se você trava o aumento do orçamento de saúde ou impõe seu crescimento conforme a inflação nos próximos 20 anos, como está proposto, o governo pressupõe que gastamos muito em saúde não porque a população necessita, mas porque a economia permitiu, pois, o tratamento das doenças dessas pessoas só ocorreu porque havia dinheiro acima da inflação e do planejado. Contudo, se agora a economia não permitir mais, ou não permitir que dinheiro que não seja planejado anteriormente seja entregue, logo a população não irá mais adoecer.

É um raciocino errado com aparência de verdadeiro, uma falácia. Ninguém acredita que o governo está fazendo isso para prejudicar a vida das pessoas, ocorre que houve a ausência de debate com especialistas no setor de saúde, bem como não foi realizado ou sequer solicitado um estudo para averiguar as consequências em longo prazo.

Este é o grande impasse, especialistas de saúde apontam uma prioridade, especialistas em economia apontam outra e você se pergunta: qual problema devemos resolver primeiro?

sexta-feira, 4 de novembro de 2016

Golpe jurídico-parlamentar-midiático de 16. Como o STF ajudou na derrubada de Dilma Roussef, com suas decisões rápidas (prisão de Delcídio), demoradas (afastamento de Cunha) e combinadas com a Lava Jato.

Pesquisadora explica como STF influenciou no impeachment

Leonardo Sakamoto - Blog do Sakamoto - 04/11/2016

Charge Renato Aroeira

''Quando se combina as decisões do impeachment com as da Lava Jato, verificamos que o Supremo teve uma grande influência no curso do impeachment'', afirma Eloisa Machado de Almeida, professora da FGV Direito SP, doutora em Direito pela USP e coordenadora do Centro de Pesquisa Supremo em Pauta.

Eloísa atua no acompanhamento das decisões do Supremo Tribunal Federal e uma das pesquisas que coordena tem analisado as decisões do STF junto às da operação Lava Jato. De acordo com ela, o tribunal jogou com o tempo, deixando alguns atores livres (mesmo em condições para prisão preventiva) e bloqueou outros, influenciando no processo de cassação de Dilma Rousseff. Ela separa três momentos decisivos listados que podem ser lidos no post.

Ela separa três momentos decisivos. Primeiro, a prisão em flagrante do então senador Delcídio do Amaral (PT), por decisão do ministro Teori Zavascki a pedido do procurador geral da República Rodrigo Janot, em 25 novembro de 2015. De acordo com ela, isso deu força para que o processo de impeachment fosse aceito por Eduardo Cunha, então presidente da Câmara, no dia 2 de dezembro do mesmo ano.

Segundo, houve a quebra de sigilo e divulgação da conversa telefônica entre Dilma e Lula sobre a sua nomeação para ministro da Casa Civil, em 16 de março de 2016, quando este ainda não era réu pela Lava Jato. Isso teria o intuito de garantir foro privilegiado a ele. Na sequência, o ministro Gilmar Mendes, impediu que Lula tomasse posse. De acordo com Eloia, esse episódio deu um fôlego extraordinário ao processo na Câmara dos Deputados, que autorizou a abertura do impeachment no mês seguinte.

Por último, somente após o impeachment ser encaminhado ao Senado, Eduardo Cunha foi afastado do mandato de deputado federal e, consequentemente, da presidência da Câmara por uma decisão do ministro Teori Zavascki.

Segundo, a pesquisadora, no curso do impeachment, o STF reproduziu o rito de 1992, garantindo um curso morno do processo. Mas essas decisões extraordinárias, relacionadas ao desdobramentos da Lava Jato, tiveram impacto no impeachment e foram responsáveis pelo seu desfecho.

A entrevista com a professora Eloísa Machado também abordou outros temas, incluindo o protagonismo do Supremo Tribunal Federal neste momento do país, as consequências de um Poder Judiciário mais forte que os outros dois poderes e a noção de Justiça no Brasil:

A Suprema Corte é um tribunal progressista ou conservador?

Continue lendo no Blog do Sakamoto

quinta-feira, 3 de novembro de 2016

Sabem quem sempre foi contra o 13º salário, desde sua criação? A mídia, essa grande defensora dos direitos dos trabalhadores. Só que não.

Adeus, Natal: a direita quer acabar com o 13º “contra a crise” tirando 170 bi da economia

Por Cynara Menezes - Socialista Morena - 03/11/2016 -

É muita burrice, não de quem fala, porque tem outros interesses por trás, mas de quem acredita. Movimentos de direita orquestrados como o MBL (Movimento Brasil Livre) defendem acabar com o 13º salário sob a justificativa de que o valor poderia ser diluído nos outros doze salários e, com isso, o trabalhador ganharia “8% mais”, o que por si só já é mentira. Obviamente, o que iria acontecer é que o trabalhador iria ganhar o mesmo salário em 12 vezes e ainda ficaria sem o abono natalino. Só trouxa, portanto, cairia nesta conversa.

Mas a questão que quero levantar é uma falácia ainda maior. Os direitistas querem acabar com o 13º como uma das “saídas” mágicas para a economia e o desemprego. No entanto, o 13º salário injeta todos os anos mais de 170 bilhões de reais na economia –em dezembro de 2015, segundo o Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), foram 173 bilhões de reais, ou 2,9% do PIB (Produto Interno Bruto). Qualquer pessoa com cérebro perceberia que, sem o 13º, não só o comércio natalino ficaria à míngua como milhões de pessoas iam perder os seus empregos.



Ou seja, a resposta da direita para a crise na verdade a aprofundaria. Nenhum dos ~estudos~ apresentados pelos “liberais” que defendem a aberração de se extinguir o 13º salário se dedica a avaliar qual será o impacto disso sobre o comércio. Traduzindo em miúdos, no que depender da direita brasileira, adeus Natal. Tanto para quem compra quanto para quem vende. É essa a “solução” dos gênios da direita?

Abra o olho. Não caia na conversa de quem se apresenta como defensora dos seus direitos querendo acabar com seus direitos. O único interesse dessa gente é defender os privilégios de quem já tem privilégios, ou seja, eles mesmos. Pense comigo: como é que gente que não é da classe trabalhadora poderia estar preocupado em defender os trabalhadores?

Sabem quem sempre foi contra o 13º salário, desde sua criação? A mídia, essa grande defensora dos direitos dos trabalhadores. Só que não.



Minor Carta: O governo Temer é uma monarquia neoliberal e sem rei. O golpe de 1964 entrega o Brasil à ditadura. O golpe de 2016 entrega-o a uma espécie de monarquia.

Monarquia sem rei

Por Mino Carta - CartaCapital - 31/10/2016

Só assim se explica a agressão cometida contra o Brasil e os brasileiros. É como se a casa-grande decretasse: “O Estado sou eu”

O franciscano dom Paulo Evaristo é um exemplo de sabedoria e destemor. Na segunda 24 foi homenageado por seus 95 anos no Teatro da Universidade Católica de São Paulo, com participação de figuras ilustres e um público pronto ao grito de “fora Temer”. Nos tempos da ditadura, debaixo da batina, dom Paulo vestia uma armadura. Hoje faz muita falta.

O desafio à ditadura do então cardeal arcebispo paulista é uma página histórica que convém ler e reler. Hoje vivemos uma situação ainda pior e a respeito tenho conversado constantemente com os meus botões, para concluir que o Estado de exceção em que mergulhamos é algo assim como uma monarquia por direito divino, embora sem rei.

Em lugar do soberano, uma entidade superior por obra de uma teologia específica, dissociada de qualquer referência contemporânea, a não ser na aplicação fervorosa do neoliberalismo, a ser entendido, na minha visão, como neoliberismo. Permito-me sustentar que o neoliberalismo é também monárquico no sentido medieval.

Dom João VI, o rei de Portugal que jamais tomou banho, ao aportar no Brasil nos começos do século XIX, antecipou esse desfecho ao longo de um enredo desenrolado por mais de 200 anos. Fugia do exército napoleô­nico, que chegava para difundir as ideias da Revolução Francesa e, segundo os meus botões, não somente deu a saída do entrecho, mas também cuidou de estabelecer, quem sabe sem se dar conta, o seu propósito central. Ou seja, manter respeitoso e definitivo distanciamento de ideais renovadores.

Chamo esta entidade monárquica de casa-grande, a qual permanece rigorosamente impermeável a veleidades progressistas. E acaba de dizer, em tom de edito: “O Estado sou eu”. Houve a notável tentativa do governo Lula, e agora soçobra. O golpe de 1964 entrega o Brasil à ditadura.

O golpe de 2016 entrega-o a uma espécie de monarquia. Não há outra forma de perceber a prepotência, a arrogância, a desfaçatez de um poder que tudo se permite, impunemente, diante de um povo resignado, conforme manda a regra da senzala.

O que mais há de inquietar dom Paulo nesta moldura em que a tragédia sobrepuja a farsa? A agressão das reformas do governo a serviço da casa-grande contra o próprio ser humano, no individual e no coletivo.

Contra o trabalhador, contra os estudantes e seus mestres, contra os desvalidos em geral. É tudo o que contraria e ofende a doutrina cristã da igualdade, na contramão do pensamento do papa, um jesuíta chamado Francisco. Mas seria Cristo um comunista?

Nunca esquecerei uma longa e edificante conversa que tive com dom Paulo, quando já deixara o comando da Arquidiocese. Contou-me, a certa altura, de uma visita feita a João Paulo II no Vaticano, e produziu então uma perfeita imitação do papa Wojtyla, trêmulo na voz e no gesto. Foi fácil entender que não apreciava o pontífice obcecado pela fúria anticomunista e capaz de permitir que a chamada Santa Sé se tornasse digna dos tempos da devassidão renascimental.

Aposto que grande apreciador do papa polaco é o atual presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Ives Gandra Martins Filho, que ali chegou graças à determinante ajuda do ministro Gilmar Mendes, o mesmo que agora desmente quanto já afirmou, imperiosamente, como é do seu temperamento.

Martins Filho vive apartado em Brasília, de perfil baixo, longe da presidência do TST, quando se recolhe piedosamente a um centro de retiro habitado por seguidores da Opus Dei, a organização mais reacionária do catolicismo. No caso, a meditação não favorece a piedade cristã.

De fato, ele costuma expor conceitos diametralmente opostos àqueles do papa Bergoglio contra a sanha neoliberal, para se tornar o Torquemada dos trabalhadores brasileiros, empenhado em inaugurar uma versão atualizada dos autos da fé.

Dom Paulo e Martins Filho, formas opostas de interpretar a doutrina cristã. Certo é, porém, que o crucificado está com o seu cardeal, para sempre. Não há como duvidar que seja esta a verdade factual.

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Para o português Boaventura Santos a esquerda brasileira precisa reagir ao “golpe constitucional-judicial”, como fez o campo progressista em Portugal, quando reagiu a "um fundamentalismo ideológico do mesmo tipo".

"O que mais custa aceitar é a participação do Judiciário no golpe"

Por Miguel Martins - CartaCapital - 02/11/2016

Em entrevista a CartaCapital [o sociólogo português Boaventura Santos ], faz uma radiografia da crise política brasileira, chama o congelamento de investimentos públicos por 20 anos de “escândalo constitucional e político” e releva sua indignação com a seletividade da Justiça. "O que mais custa aceitar é a participação agressiva do sistema judiciário na concretização do golpe." 


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BS: No caso do Brasil, o que mais custa a aceitar é a participação agressiva do sistema judiciário na concretização do golpe, tendo em vista dois fatores que constituíam a grande oportunidade histórica de o sistema judicial se afirmar como um dos pilares mais seguros da democracia brasileira. Por um lado, foi durante os governos PT que o sistema judicial e de investigação criminal recebeu o maior reforço não só financeiro como institucional. Por outro lado, era evidente desde o início que Dilma Rousseff não tinha cometido qualquer crime de responsabilidade que justificasse o impedimento. Estavam criadas as condições para encetar uma luta veemente contra a corrupção sem perturbar a normalidade democrática e, pelo contrário, fortalecendo a democracia. Por que é que esta oportunidade foi tão grosseiramente desperdiçada? O sistema judicial deve uma resposta à sociedade brasileira.
(...) 

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BS: A PEC 241 é um escândalo constitucional e político, produto de um descontrolado fundamentalismo ideológico, desprovido de qualquer eficácia e apenas adotado com dois objetivos de alto poder simbólico. Primeiro, mostrar ao povão pobre e empobrecido a impossibilidade de esperar algo do Estado, como se ninguém pudesse lhe prometer nada para além do que a direita está disposta a dar-lhe. Segundo, sublinhar com uma risada legislativa o desprezo, o revanchismo e a arrogância com que, do alto da sua vitória, contempla a ruína da esquerda. O excesso desta medida, nunca adotada em qualquer país por um período de 20 anos, deve ser visto pela esquerda como um sinal de debilidade.
(...)

BSO caso português tem algum interesse neste contexto. Os portugueses foram vítimas entre 2011 e 2015 de um fundamentalismo ideológico do mesmo tipo. O Primeiro Ministro de então, Passos Coelho, chegou a dizer que era preciso ir mais longe nas políticas de ajuste estrutural do que a própria troika austeritária exigia, formada pelo FMI, Banco Central Europeu e Comissão Europeia. O maximalismo conservador fez soar nos partidos de esquerda um alerta que não se ouvia há setenta anos: a arrogância da direita ameaçava destruir tudo o que em termos de inclusão social tinha sido democraticamente construído pelo país depois da Revolução dos Cravos de 25 de Abril de 1974.

O país enfrentava uma situação de fascismo social que mais tarde ou mais cedo poderia levar ao fascismo político. Perante isto era preciso esquecer provisoriamente todas as diferenças ideológicas que pudessem impedir uma aliança das forças de esquerda para pôr termo ao pesadelo reacionário. Assim se construiu uma aliança de governo entre o Partido Socialista, a coligação CDU (comunistas e verdes) e o Bloco de Esquerda. Este exemplo pode ajudar as forças de esquerda no Brasil, que, ao contrário de Portugal, se inclui um forte movimento popular frentista, a esquecer as diferenças e articular-se procurando seguir a sabedoria popular: em momentos como este, que se vão os anéis e fiquem os dedos.

(...)

A ENTREVISTA COMPLETA NA CARTACAPITAL

terça-feira, 1 de novembro de 2016

PSDB e PMDB (partidos campeões da ficha suja no TSE) se deram bem nas urnas porque a mídia acobertou seus casos de corrupção.

Vitória eleitoral de PSDB e PMDB se deve a omissão da mídia

Por Eduardo Guimarães - Blog da Cidadania - 01/11/2016
Ranking de ficha-suja 2016, segundo o TSE
Um fato é inegável e tem que ser analisado, pois, sem reflexão, será entendido de forma errada. Refiro-me à expressiva redução do PT e a chamativa vitória do PSDB e do PMDB na eleição municipal de 2016. E para uma visão rápida do que ocorreu, bastam poucos dados.

O PT passou das 644 prefeituras que detinha em 2012 para 254 em 2016 (-61%).

O número de prefeitos tucanos passa de 701 para 803, e a população governada pelo PSDB salta de 25,8 milhões para 48,7 milhões (o PT encolheu de 38 milhões para 5,9 milhões).

Mas o dado mais chamativo diz respeito ao volume assombroso de prefeitos eleitos neste ano que apoiam o governo Temer: 83% !!

Uma das “explicações” mais populares (e irrefletidas) para o fenômeno acima é muito simples de ser formulada: O PT perdeu tanto por conta da corrupção e da crise econômica.

Ora, essa explicação não cola.

Falemos, primeiro, da corrupção. O PT tem problemas com a corrupção? Claro, como qualquer outro partido. Na Lava Jato, há mais ou menos envolvidos famosos tanto do PT quanto do PMDB e do PSDB.

Alguns dos listados a seguir foram só citados na Lava Jato, outros foram delatados. Mas o envolvimento de todos é inegável. Se investigam uns e não investigam outros apesar de todos merecerem investigação por terem sido citados, é outra coisa.

PMDB = PT = Gleisi Hoffmann, José Dirceu, Guido Mantega, Antonio Palocci, João Vaccari, Lula, Lindbergh Farias

PMDB = Edson Lobão, Eduardo Cunha, Luiz Fernando Pesão, Renan Calheiros, Romero Jucá, Roseana Sarney, Valdir Raup, Michel Temer

PSDB = Aécio Neves, Antonio Anastasia, Geraldo Alckmin, José Serra, Aluizio Nunes, Eduardo Azeredo, Fernando Henrique Cardoso

Se a corrupção fosse o problema, portanto, não haveria por que punir o PT tão duramente. Além do envolvimento maior ou menor de tucanos e peemedebistas famosos na Lava Jato, os dois grandes vitoriosos da eleição municipal de 2016 são partidos campeões da ficha suja no TSE.

Reportagem do site Congresso em Foco publicada há algumas semanas mostra o ranking da sujeira político-partidária no Brasil.

Confira, abaixo, a lista dos políticos barrados na recente eleição por terem problemas com a lei.

PARTIDO QUANTIDADE

PMDB      93

PSDB       63

PSD          50

PR            46

PSB          45

PP            44

PDT         43

PT            42

DEM        35

PTB          33

PRB          30

PV            29

PPS           23

PCdoB       22

PTN           21

SDD           21

PROS         20

PEN            19

PHS            18

PMN           18

PSDC         18

PSL            18

PSC            16

PRTB         11

PPL           10

PRP             9

PTC             9

PMB           8

PSOL          8

PTdoB         8

REDE          2

Como se vê, é estúpida a versão de que o PT seria mais ou menos corrupto. Corrupção é inerente aos grupos políticos, empresariais, laborais etc. Sempre haverá gente tentando se locupletar.

Quanto à questão da economia, como o PMDB pode ser visto como salvação da lavoura se ele governou junto com Dilma e Lula, tendo uma representação nesses governos igual ou (às vezes) até maior que a do PT?

Então, se corrupção e crise econômica não explicam racionalmente a derrocada do PT e a ascensão e glória do PSDB e do PMDB, qual é a explicação para esse fenômeno.

A versão é sempre mais forte e definitiva que o fato. Apesar de não haver maiores distinções entre a corrupção no PT e em outros partidos, para a formação da imagem mental das pessoas a mídia (sobretudo a TV) têm uma grande força ao longo do tempo.

Ora, se no Jornal Nacional aparecem só petistas sendo acusados enquanto tucanos e peemedebês não aparecem (JN escondeu denúncias contra José Serra), é óbvio que a população vai se acostumando a associar só o PT à corrupção.

O quadro, porém, parece mais desalentador do que realmente é. O golpe e a manipulação midiática não foram empreendidos à toa. O objetivo do golpe é piorar a vida do povo. Não por maldade, mas para tirar de pobre para dar a rico.

Não é sadismo, é ganância. Ricos querem mais, não querem ver dinheiro público alimentando ou educando pobre; dinheiro público é para rico tomar empréstimo a fundo perdido.

A melhor forma de fazer o povo mudar de opinião é levando a cabo o programa econômico dos golpistas. Pobreza vai aumentar, desigualdade vai explodir, vidas serão destruídas. Não há melhor escola que o sofrimento.

Você vai ao site dos picaretas do MBL e os vê ensinando aos trouxinhas (contração de trouxa com coxinha) que é melhor para eles perderem férias, 13º, fundo de garantia etc. Que é melhor ser terceirizado. Que é melhor se aposentar só aos 70 anos.

E pode ter certeza, leitor, de que a “pobraiada” engabelada pelo PSDB e pelo PMDB vai até o fim, vai ter que pagar para ver – ou melhor, pagar para sentir – quanto dói uma saudade – no caso, saudade do tempo em que o salário crescia todo mês e o desemprego caía todo mês.