Lelê Teles - Brasil 247 - 8 de Setembro de 2015

nego achou que Moura se entregou, todo mundo percebeu, pelo sotaque, que ele era brasileiro.
um jornalista progressista chegou a perguntar por que não chamaram um ator hispano hablante para fazer o papel.
pergunta bisonha essa, o espanhol é idioma oficial em 21 países, ele tem uma gama enorme de variações e sotaques.
bobagem, portanto.
e mais, copiar o idioleto, que é a marca individual de fala, é um recurso de imitadores e não de atores.
para mim, essa celeumazinha é apenas mais uma manifestação do Viralatismo, um movimento que cresce a cada dia no Brasil.
é bom saber, o Viralatismo se opõe ao Modernismo e seu expoente símbolo é o cantor Ed Motta, aquele que não aceita ser reconhecido como um artista latino e prefere definir a si mesmo como um artista latindo.
o Viralatismo, antípoda do Modernismo, tem como conceito e meta síntese "só a autofagia nos desune".
o negócio é meter o pau em qualquer traço de excesso brasilidade de patrícios com sucesso no exterior.
só deglutimos bem, nas estranjas, o sucesso de brasucas loiras de olhos claros como Gisele Bundchen.
Padilha, Moura, Coelho e Britto não nos representam, latem os vira-latas.
se antes, no Modernismo, a proposta era deglutir o legado cultural europeu e regurgitá-lo como uma arte tipicamente brasileira; hoje, no Viralatismo, queremos nos deglutir a nós mesmos para ver se extraímos daí novamente a arte europeia pura, sem resquícios de brasilidade.
absurdo, paradoxal e oximórico, o Brasil é capaz de produzir vira-latas com pedigree.
espécimes endêmicos destas terras tropicais e exclusivos destas paragens, o viala-lata com pedigree tem como marca o rabo fino e sua meta síntese é tentar morder o próprio rabo.
Paulo Coelho é um escritor aclamado no mundo inteiro, mais de 130 milhões de livros vendidos em mais de 160 países. por isso mesmo, no Brasil, ele é odiado por uma multidão que nunca leu um único livro dele.
o odeiam simplesmente por ele ser brasileiro e ter feito sucesso como escritor. imagina, um ex-parceiro de Raul Seixas, um ex-tomador de chás de cogumelo!
Romero Britto é igualmente odiado pelo viralatismo. o pernambucano, com cara de trabalhador, faz uma pop art - mais pop do que art - alegre, vibrante, colorida e que encanta uma multidão; palmas pra ele.
só que não.
há algo no sotaque de Coelho, Britto e Moura, que incomoda os vira-latas.
quando ouço o ladrar dos cães de rua contra Wagner Moura pelo sucesso que faz no papel de Pablo Escobar, lembro que nunca os ouvi ladrar contra o sotaque do Olivier Anquier.
aliás, todo vira-lata acha lindo um francês falando português com aquele sotaque engraçado do Grilo Falante.
por isso os franceses fazem sucesso nos programas de gastronomia, é mais pelo sotaque que pela comida que fazem.
todos querem ouvi-los dizer alhô, cebolá, macarrón...
é por isso que gênios do marketing pessoal como Inri Cristo, Padre Quevedo e o ex-rabino Henri Sobel carregam no sotaque.
é como jogar um osso para um vira-lata.
no mais, o cinema americano está repleto de atores alemães, belgas, italianos, espanhóis, ingleses... todos com o seu sotaque.
aliás, o sotaque do austríaco Arnold Schwarzenegger não lhe atrapalhou em nada, tanto é que ele se tornou governador da Califórnia.
só atrapalha o sotaque de Moura.
lanço essa crônica como o manifesto autofágico não oficial; carece ainda de uma marca, uma logomarca: um cão vila-lata a morder o próprio rabo.
algum artista se habilita?
Palavra da salvação.
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