247 - 31/07/2013
Reportagem do SBT mostra médicos de um hospital público de São Paulo, mantido pelo governo do Estado, entrarem, baterem o ponto e irem embora, ficando, às vezes, cerca de dez minutos dentro do local; abordados, os profissionais gaguejaram desculpas como estarem indo tomar um café ou terem chegado para visitar um paciente
247 - Em meio a protestos da classe médica, que alega estar sendo mal tratada pelo governo da presidente Dilma Rousseff e traída pelo ministro da Saúde, Alexandre Padilha, o SBT produziu uma importante reportagem, que mostra médicos de um hospital público de São Paulo que se limitam a marcar o ponto e ir embora.
É claro que, como há em todos os setores públicos, a irresponsabilidade de alguns não pode ser generalizada, a ponto de prejudicar a imagem de ótimos profissionais que querem e têm o prazer de trabalhar. Mas a denúncia vem num momento crucial de discussão sobre o setor e sobre a necessidade de mais médicos e recursos para a área da saúde.
Leia abaixo post do blog Tijolaço sobre a reportagem e assista ao vídeo:
Fernando Brito - O repórter Fábio Brilhante, do SBT, e sua equipe montaram uma "campana" à porta da maternidade pública Leonor Mendes de Barros, na zona leste de São Paulo e mantida pelo Governo do Estado, durante alguns dias. E flagraram diversos médicos que entram, batem o ponto eletrônico e, menos de 15 minutos depois, embarcam em seus carros e vão embora.
A cena foi gravada em diversos dias, sempre da mesma forma. Abordados, os médicos gaguejaram desculpas como estarem indo tomar um café ou terem vindo ver um paciente.
Repetem, de maneira presencial, o caso dos dedos de silicone usados para bater o ponto em uma unidade de saúde em Conselheiro Ferraz.
Entende-se que, agindo dessa maneira, estes doutores sejam inimigos mortais de um programa de contratação de médicos para as periferias e municípios do interior. Assista:
Leia abaixo a transcrição do vídeo:
REPÓRTER FÁBIO DIAMANTE: Maternidade Leonor Mendes de Barros, zona leste de São Paulo. Um hospital público, considerado referência no atendimento à mulher. Meta de mil partos por ano, a menina dos olhos da saúde de São Paulo hoje é usada em uma vergonhosa fraude mantida por médicos.
ENTREVISTADA 1: "O pior de tudo isso é que é com conivência do diretor".
REPÓRTER FÁBIO DIAMANTE: A partir de agora você vai ver o dinheiro público indo para lata do lixo, ou para o bolso de quem não merece. Terça-feira, 16 de julho, pouco antes da 7h da manhã.
O médico chega para o trabalho, é Rogério Gondo, um endocrinologista. Ele entra e em 11 minutos sai. Dr. Rogério só bateu o ponto e foi embora. O controle é feito por este equipamento. O horário de entrada é registrado com a digital.
Dois dias depois, tudo igual, o médico para o carro no mesmo lugar, estacionar dentro do hospital pode não ser uma boa ideia, já que o segurança registra a entrada e a saída. Não é à toa que sobram vagas. A pé o doutor entra pela porta exclusiva dos funcionários.
ENTREVISTADO 1: "Entrada de funcionários, a pé, é por aqui".
REPÓRTER FÁBIO DIAMANTE: De novo ele sai rapidinho, sem atender nenhum paciente. Olha só, pelo terceiro dia o médico está chegando aqui, ele parou o carro na rua. Dia de chuva. Vai passar aqui por mim. Ele está até com o crachá no peito, vai lá bater o ponto, pra ir embora rapidinho. Olha, menos de dez minutos depois ele já está saindo. Dinheirinho fácil esse, né? Ele vai pegar o carro, e vai embora.
Outros colegas repetem o péssimo exemplo. Este é o cirurgião geral da maternidade, Luís Henrique Nucci. Pouco antes das 7 horas da manhã ele chega, de jaleco. Ele também para o carro na rua. Em seguida é a vez do cirurgião plástico Roberto Luiz Sodré. Pouco mais de cinco minutos os dois saem, juntos, os doutores bateram o ponto para conversar na calçada, do lado de fora. O papo é longo, dura quase dez minutos, em seguida eles vão embora, cada um no seu carro.
Uma semana depois, olha o cirurgião plástico chegando de novo, terça-feira, 23 de julho. São exatamente 7h14 da manhã, o médico acabou de entrar. A gente vai ver exatamente quanto tempo ele demora para sair agora. Vamos marcar no relógio. Sete e quarenta da manhã. Quer dizer, 26 minutos de trabalho, foi o que o médico perdeu de tempo aqui no hospital público. Agora, ele vai pegar o carro dele, tranquilo, vai trabalhar em outro lugar...
E muitos outros fazem igual: chegam e logo vão embora. O absurdo chegou a tal ponto que um documento foi afixado nas paredes de diversos setores para relembrar que o médico tem que trabalhar. Olha só, o texto ressalta a importância da permanência após o registro da presença e completa: em caso de ausência, o ponto deverá ser cancelado e o dia considerado como falta.
Mas o aviso não adianta. Essas imagens se repetem quase todos os dias. E eles, os doutores, o que dizem? Esperamos pelos médicos na porta do hospital. Primeiro, Dr. Rogério entrou, saiu e deu de cara com a gente. Dr. Rogério, tudo bem? Bom dia! Posso dar uma palavrinha com o senhor?
ENDOCRINOLOGISTA/ROGÉRIO CONDO: Não, não. Estou meio atrasado.
REPÓRTER FÁBIO DIAMANTE: O senhor já está indo embora do hospital?
ENDOCRINOLOGISTA/ROGÉRIO GONDO: Estou. Eu tenho que fazer as minhas coisas. Desculpa.
REPÓRTER FÁBIO DIAMANTE: O senhor acabou de chegar, não foi isso?
ENDOCRINOLOGISTA/ROGÉRIO CONDO: Não, não. Eu só vim ver um paciente e estou indo.
REPÓRTER FÁBIO DIAMANTE: Há algumas semanas, a gente tem vindo aqui e temos visto o senhor entrar e sair rapidamente.
ENDOCRINOLOGISTA/ROGÉRIO CONDO: Não, não, não. Desculpa. Eu só vou pegar... Vim ver um paciente no hospital e vou embora.
REPÓRTER FÁBIO DIAMANTE: Depois, o cirurgião geral Luís Henrique. Hoje, ele não ficou nem cinco minutos no hospital. O senhor trabalha aqui no Leonor?
CIRURGIÃO-GERAL/LUÍS HENRIQUE NUCCI: É, estou saindo do hospital.
REPÓRTER FÁBIO DIAMANTE: O senhor vem, bate o ponto, está recebendo por isso e vai embora?
CIRURGIÃO-GERAL/LUÍS HENRIQUE NUCCI: Na verdade, não é questão de estar recebendo, você tem que cumprir 20 horas semanais.
REPÓRTER FÁBIO DIAMANTE: E o senhor cumpre 20 horas semanais?
CIRURGIÃO-GERAL/LUÍS HENRIQUE NUCCI: Na verdade, eu cumpro muito mais do que 20 horas semanais, porque eu estou sempre à disposição do hospital. Eu não acho justo você ficar aqui dentro parado 12 horas, 10 horas, sem atividades.
REPÓRTER FÁBIO DIAMANTE: Para encerrar, o cirurgião plástico Roberto Sodré. Doutor, posso dar uma palavrinha com o senhor? O senhor é o Dr. Roberto, não é?
CIRURGIÃO-PLÁSTICO/ROBERTO SODRÉ: Sou.
REPÓRTER FÁBIO DIAMANTE: O senhor bateu o ponto e já está indo embora?
CIRURGIÃO-PLÁSTICO/ROBERTO SODRÉ: Eu estava indo, na verdade, tomar um café aqui, na esquina. Estava indo tomar um cafezinho aqui no...
REPÓRTER FÁBIO DIAMANTE: O senhor vai tomar café e vai voltar para o trabalho?
CIRURGIÃO-PLÁSTICO/ROBERTO SODRÉ: Posso voltar.
REPÓRTER FÁBIO DIAMANTE: Ou pode não voltar?
CIRURGIÃO-PLÁSTICO/ROBERTO SODRÉ: Exato. Posso voltar agora, não tem problema.
REPÓRTER FÁBIO DIAMANTE: O senhor está voltando porque eu estou perguntando ou o senhor voltaria?
CIRURGIÃO-PLÁSTICO/ROBERTO SODRÉ: Oi?
REPÓRTER FÁBIO DIAMANTE: Acha correto o senhor bater o ponto e ir embora? Receber sem estar trabalhando aqui? Cumprindo a sua carga horária?
CIRURGIÃO-PLÁSTICO/ROBERTO SODRÉ: Na verdade, a gente cumpre a carga horária.
REPÓRTER FÁBIO DIAMANTE: Que horas? Porque o senhor vai embora.
CIRURGIÃO-PLÁSTICO/ROBERTO SODRÉ: Não, mas veja bem: quando a gente não tem mais o atendimento, não sei porque ficar também. Veja bem...
REPÓRTER FÁBIO DIAMANTE: Procurado, o governo de São Paulo disse que vai investigar.
PRESIDENTE DA CORREGEDORIA GERAL DA ADMINISTRAÇÃO/GUSTAVO UNGARO: O governador Geraldo Alckmin já determinou que a Corregedoria Geral da Administração apure esta situação para imediatamente instaurar um processo correcional, que poderá resultar na demissão a bem do serviço público de quem esteja fraudando o seu dever para com a população.
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