CARTA ABERTA AO MAIOR DE NÓS
Por Francisco Costa - via Facebook - 29/04/2018
Charge: Osmani Simanca |
Meu companheiro Lula
Posso imaginar como você está se sentindo aí.
Não me refiro ao confinamento físico, este sei que você tira de letra e calcanhar, mas à condição psicológica, a de se sentir injustiçado.
Não pedirei para você pensar positivo, você é mestre nisso também, mas há males que vêm para o bem. Fosse eu religioso e diria que Deus escreve certo por linhas tortas.
Você já está no pódio da História, ao lado de Ghandi, Mandela, Luther King, Che... E só lhe faltava uma cadeia injusta, para se igualar a eles em todos os detalhes, com uma ressalva: Ghandi era de casta nobre, estudou na Inglaterra, o mesmo acontecendo com Mandela, da elite em seu povo. King era filho de pastor nacionalmente conhecido, e com estudos superiores, Che era médico, enquanto você... Um Paraíba pau de arara, fruto da terra, criado sem pai, proleta em linha de montagem de automóveis... E hoje... Cidadão do mundo.
Hoje amanheci pensando em que brasileiro eu poderia comparar com você, e só encontrei um: Pelé.
Não me refiro ao Edson Arantes, ao qual tenho restrições, mas ao Pelé, o filho do Dondinho e da miséria brasileira, que se transformou em sinônimo de Brasil.
Nas décadas de 60 e 70, esta sonora e simples palavra, Pelé, ecoava no mundo todo, entre os agricultores no interior da China e os doutorandos de Coimbra e da Sorbonne; nas tribos africanas e nos palácios europeus; entre os pescadores do Adriático e os extrativistas da Amazônia, nas coberturas em bairros nobres e nas favelas, nas palafitas e nas mansões, como se irmanasse o mundo, com judeus, cristãos, islamitas, budistas, ateus... Pronunciando Pelé, com os mais diversificados e variados sotaques: Pelé!
Nós vivemos essa época e nos lembramos disso, companheiro.
Pois você hoje é o Pelé da hora, Lula.
Os que pensaram te encarcerar, por entre grades, mais não fizeram que expô-lo ao mundo, que hoje pronuncia Lula como um dia pronunciou Pelé.
Você hoje é símbolo nacional, emblemática imagem de um país, como Mandela para a África do Sul, Ghandi para a Índia, Lincoln para os Estados Unidos... Capítulos a parte na História dos povos, ou como disse um poderoso, você é o cara.
Você tinha tudo contra: as origens, miséria e carências; a falta de escolaridade, numa sociedade de classe dominante preconceituosa e prepotente, telespectadora da Globo e pretensamente culta; uma voz rouquenha, dificultando a oratória; a estatura baixinha... Como Pelé, que mal falava, teve problemas de saúde na infância, apontando para a inadaptabilidade aos esportes, o pouco estudo...
Em comum, o talento inato, aquela centelha diferenciadora e ocasional, que acomete a poucos e só raramente, fazendo com que você faça na política e na administração pública o que ele fez no futebol: ter a capacidade de jogar em qualquer posição do time, com a mesma eficiência e rendimento, levando ao desespero os adversários cometendo faltas, agredindo, contundindo, sem perceberem que com isso estavam e estão confessando as próprias limitações, a inferioridade, medíocres diante do talento.
Não se considere preso, companheiro, mas apenas contundido, pronto para logo voltar ao campo, quando, mais que o Brasil, o mundo inteiro vai vibrar em uníssono, como um dia vibrou com um gol de Pelé, em final de Copa do Mundo.
Francisco Costa
Rio, 23/04/2018